Por Roberto DaMatta - O Estado de S.Paulo
Um velho amigo, Álvaro Acioli, me lembra uma frase do ferino Eça de Queiroz: "Os políticos e as fraldas devem ser trocados frequentemente e pela mesma razão". Citação mais do que apropriada neste momento em que somos legalmente impingidos com a "propaganda eleitoral gratuita", essa marcha de caras e promessas que precedem o ritual democrático da mais alta importância: a hora de trocar certos atores por meio de uma escolha - a eleição.
A troca, data vênia, das fraldas, para ficarmos com o velho Eça, tem suas etiquetas. No nosso caso, ela promove na TV um desfile hierarquizado por tempo de exposição dos candidatos; um tempo subordinado ao poder do partido de cada aspirante. Os bem aquinhoados partidariamente têm mais tempo. Os sem-tempo tentam definir em segundos uma vida e um programa.
É quando eu me dou conta do absurdo dessa competição eleitoral dando a muitos alguns segundos, enquanto poucos podem desempenhar o papel de estrelas, o que, aliás, fazem com brilho estupendo. O modelo encenado é o de um baralho de messias. Em cada carta surge um algarismo, um naipe e um santo. Todos, porém, dotados da capacidade de prometer doses de felicidade que vão melhorar o nosso mundo e, naturalmente, o deles. O programa deixa ver como nossa concepção de poder é feita com altares e promessas: com relações de simpatia mais do que laços ideológicos e competências. Salta aos olhos a linguagem do compadrio e do parentesco como um atestado da habilidade dos candidatos. [continue lendo]