Por Dartagnan da Silva
Zanela (*)
(i)
Desconfie. Desconfie. Desconfie.
Mas desconfie mesmo de todo e qualquer caboclo que, empavonado, insiste sempre
em exibir-se pra ti com aquela velha e rasa cultura de almanaque. Dum modo
geral, praticamente sem a menor margem de erro, esse tipo de sujeito tem apenas
uma visão superficial de tudo com o que ele procura se exibir.
(E cuidado, compadre, muito
cuidado, que isso é contagioso).
Detalhe: cultura essa edificada
impacientemente a partir de levianas pinceladas dadas nas horas vadias através
das ondas dum buscador qualquer da internet, formando, desse modo, uma coleção
de cacos digitais que é exibida perante as almas desatentas para
impressioná-las e, ao mesmo tempo, fazer com que seu ego sinta-se massageado
pelos olhares embasbacados das mesmas almas distraídas, facilmente
impressionáveis.
Pois é, compadre, isso cansa,
cansa mesmo, mas, no fundo, é divertido pacas ver essa faceta do picadeiro da
vida brazuca; é risível - como é - testemunhar o quão grande pode ser o
ridículo que uma pessoa está disposta a se expor para não ter de encarar a sua
miséria humana.
(ii)
Se você, compadre, deseja
realmente fiar o eito do arado da sua vida pela linha que nos leva a edificação
duma vida intelectual razoavelmente séria, lembre-se que, em primeiro lugar,
isso não significa que você deverá passar a azucrinar os outros com
curiosidades superficiais adquiridas com a finalidade tonta de impressionar
ouvintes imprudentes. Significa, sim, que você deverá dedicar-se a conhecer
certas coisas que, por sua própria natureza, você dificilmente conseguirá
comunicar aos círculos de conversas vadias devido a sua sólida substância, mas
que, por essa mesma razão, irá robustecer a sua personalidade e fortalecer o seu
caráter tornando-o uma pessoa muito mais digna, prestativa e boa.
(iii)
A exibição histriônica duma
cultura de almanaque é um veneno para a formação de uma alma por uma razão
muito simples: esse tipo fragmentário de conhecimento, colhido aleatoriamente e
exibido a esmo nas rodas de conversa, acaba, sem percebermos, nos impondo dois
vícios: (i) o de nos contentarmos com o cultivo de futilidades culturais e (ii)
de almejarmos ser bajulados pelas almas sonsas quando exibimos essas
quinquilharias.
Aliás, é muito fácil cairmos
nessa ciranda maldita, haja vista a nossa grande inclinação para a sebosa via
da vaidade, não é mesmo? Pois é.
Por isso, abram olhos navegantes
e fujam, fujam mesmo, da procura por aplausos e pelo reconhecimento das almas
desatentas que não resistem a um showzinho dum mosaico cultural superficial
vivo. Isso, realmente, é algo que corrompe a alma até o tutano.
(iv)
Sei que se conselho fosse coisa
boa não era dado, mas, vá lá, permitam-me unzinho. Quando alguém vier ministrar
uma lição áurea que nos leve a aceitar que o ser humano é mau por natureza ou a
crermos que somos originariamente bons, lembre-se: não somos nem uma coisa, nem
a outra.
Não somos tão grandes assim. Não
mesmo. Na realidade, somos apenas criaturas mesquinhas, pequenas, resumindo, em
nosso estado de natureza somos fundamental e absolutamente medíocres. Só isso e
olhe lá.
(*) Professor, cronista
e bebedor de café.
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