Escrevinhação n. 1103, redigida no dia 10 de março de 2014, dia dos Quarenta Mártires de Sebaste, de Santo Emiliano e de São Macário de Jerusalém.
Por Dartagnan da Silva Zanela
A Quaresma é uma época propícia para refletirmos sobre a natureza humana, sobre nossa condição existência. Para cristandade, um tempo de penitência, de sacrifício, onde é mais do que recomendada a prática de jejuns com vista a partilharmos, mesmo que minimamente, dos sofrimentos de Cristo, num gesto de solidariedade para com o Filho do Homem, como nos ensina o Bem-aventurado Papa João Paulo II.
Nesse gesto tão pequeno, com a intenção e o coração voltado para Aquele que, por amor, entregou-se ao madeiro da cruz, aprendemos o quão frágeis somos. Sentimos o quão mísera é nossa força de vontade. Imaginamos, corriqueiramente, que podemos mudar o mundo e que estamos autorizados a corrigir os males feitos por todos como se fossemos deuses (Gênesis III; 4-5). Na verdade, imaginamos muitas coisas. Cremos estar mais do que autorizados para realizar mundos e fundos ao mesmo tempo em que desdenhamos tudo aquilo que devemos realmente fazer.
Mas não queremos ouvir essa conversa. Muitos dizem, soberbamente, que esse papo de penitente é coisa do passado. Ledo engano. A vida humana sempre foi e, sempre será, um rosário de holocaustos, gostemos ou não deste fato. Viver é um ato de sacrifício.
Quando preterimos alguma coisa em preferência de algo estamos realizando um ato de sacrifício. Quando deixamos de realizar alguma coisa o fazemos em favor de algo, ou de alguém, sempre. Por isso, a questão que não pode, e nem deve, ser calada é justamente essa: em nome de que realizamos os pequenos e grandes sacrifícios de nossa vida? Em favor de quem realizamos esses atos?
Engraçado. Abrimos mão de muitas coisas, mas sempre, em favor do grande ídolo da modernidade: nós mesmos. Nosso Baal umbilical. Não é por menos que quando alguém ousa falar da importância da prática do jejum quaresmal, rapidamente surge uma chusma de vozes soberbas gritando e rotulando tal observação como sendo um parvo colóquio retrogrado.
Entretanto, quando o assunto é ficarmos bonitos e sarados, a conversa é bem outra. Abstêm-se, orgulhosamente, de toda ordem de manjares. Fazem-se dietas rigorosamente traçadas, madruga-se cedo do dia, ou estendem-se o itinerário tarde da noite, para modelar o corpinho de acordo com os ditames das doentias formas modais. Detalhe: não vemos nada de ridículo nisso porque tais sacrifícios são feitos em favor da divindade preferencial de nossa vida. É a egolatria em sua radiante majestade.
Por fim, esse é o miserável estado em que nos encontramos. Criaturas embriagadas de amor próprio, incapazes de amar a Deus e ao próximo como se ama a si mesmo.
Pax et bonum
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