Por Dartagnan da Silva
Zanela (*)
(1)
Não provoque as pessoas de bom
coração. Não seja tolo de irar aqueles que têm um coração fortemente inclinado
à mansidão porque essas, mais do que todas as outras pessoas, têm adormecidas
em seu íntimo um punhado de bestas ferozes que, sinceramente, é melhor que
fiquem adormecidas. Por isso, repito: não as provoque. Não mesmo. Não queira
ver a transfiguração dessas almas adocicadas feito favos de mel em terríveis
cálices de amargo fel.
(2)
Não fique indagando sobre tudo o
que está ocorrendo e muito menos sobre o que todos estão fazendo aqui e acolá. Isso,
além de ser um trambolho inconveniente, também é um veneno para nossa inteligência
porque quem quer saber de tudo, a respeito de tudo e de todos a tempo todo,
acaba sabendo nada, sobre nada, em tempo algum. Queiramos ou não, tal
disposição indiscreta tem um poder avassalador para desordenar a nossa alma. É
por isso que, entre outras coisas, a Santa Madre Igreja condena veementemente o
mexerico e a vã curiosidade. Por essas e outras que, como dizem os populares, a
indiscrição matou o gato. Se não o matou, com toda certeza, o deixou idiota. Bem
idiota.
(3)
Nos sofrimentos humanos, o mais
agonizante, é saber que boa parte dos males que nos afligem são frutos de
nossas escolhas e, um bom tanto de nossos gemidos, apenas um tolo exagero de
nossa imaginação. E escolhemos mal por querermos parecer ser os mais espertos
dos espertos. E extrapolamos muito em nossos alaridos dolorosos por seremos tão
desfibrados quanto desordenados espiritual e moralmente.
(4)
A misericórdia é uma dádiva divina
semeada enquanto possibilidade humana em nosso coração; porém, quando empregada
com malícia para dissimular uma altivez inexistente, ao invés dela reparar o
mal impingido, ela apenas aprofunda mais e mais o cinismo daqueles que fazem da
transgressão e da barbárie um projeto de vida.
(5)
Somente almas tediosas procuram a
tal da felicidade nas miudezas do mundo; somente elas fazem dessa vã procura a
mais elevada meta a ser perseguida numa vida. Para elas, na verdade, essa seria
a única coisa digna de sua destemperada atenção e talvez, por isso, elas sejam como
são: vazias.
(6)
A leniência da justiça e a
simpatia dos formadores de opinião para com os criminosos, sejam eles miúdos ou
graúdos, tem uma força corruptora tão grande quando o próprio crime em si, seja
ele vultoso ou minúsculo.
(7)
Lembremos sempre do óbvio
ululante. Lembremos sempre que a canalhada jura de pés juntos que eles são bons-moços,
de que todo meliante afirma, veementemente, sem fazer figas, que ele é uma alma
inocente e injustiçada. Isso é tão óbvio, tão óbvio, que às vezes esquecemos,
da mesma forma que não nos lembramos que todo justo, antes de qualquer coisa,
considera-se um mísero pecador e que todo cidadão íntegro reconhece-se como
sendo um improlífico devedor de seus pares.
(*)
professor e cronista.
Site:
http://dartagnanzanela.webcindario.com/
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